domingo, 10 de janeiro de 2010

Amor x Paixão - Parte II

Tem muito espírita que coloca o orgulho e a paixão como sentimentos que contém um lado bom e um ruim. Ora, defeito é defeito e virtude é virtude. Se queremos descrever uma virtude e não sabemos o nome dela, que procuremos num dicionário uma palavra mais adequada a este sentido que queremos expressar. Ou seja, “orgulho positivo” e “paixão positiva” não existem. “amor próprio” e “vontade primária” podem substituí-las perfeitamente.

O que significa a palavra paixão? Do dicionário português latino: sofrimento (físico). Vem do latim “passio”, que significa movimento violento e impetuoso da alma. Apetite sensual, desejo violento, cupidez, libido, amor perturbado... Alguma dúvida que no Latim, amor era amor e paixão era paixão, dois sentimentos bem diferentes?

No Livro dos Espíritos, de 1857 (revisado em 1860), questões 907 a 912, Kardec e os espíritos tentam separar as paixões boas das ruins. Por que no latim do século 1 as coisas estavam separadas e no século das luzes (19) estavam misturadas? Alguma coisa aconteceu no meio do caminho. Já nos livros finais de Kardec, as paixões são devidamente tratadas como defeitos.

A resposta desta confusão é explicada pelo livro “WE, A Chave de Psicologia do Amor Romântico”, de Robert ª Johnson (1987, Ed. Mercuryo, desvenda um problema concebido no século 12, na baixa idade média: o mito do amor romântico. Além de boa leitura o livro analisa o mito de “Tristão e Isolda”, da paixão correlacionada com amor, no século 12, com a criação do amor romântico, influenciando a literatura, a música, as artes em geral. Depois do século 12, nós começamos a confundir os dois até os dias de hoje.

No século 12, o príncipe casava com a princesa, isso até minha filhinha de 4 anos sabe. O que ela não sabe é que um vassalo vivia pela princesa um sentimento muito forte, de um amor que não iria se consumar. As preocupações do vassalo passam longe se a princesa é feliz ou não, do que ela gosta, de como ele pode ajudá-la. Ele a quer para si. Quando ele pensa nela com ele, ele sai da realidade, vai para um ponto em seu coração que não existe a dor. É a paixão.

A paixão é egoísta. Quando nos apaixonamos, estamos apaixonados por nós mesmos e não pelos outros. Só pensamos em nós mesmos, não estamos felizes por desprendimento em relação à pessoa objeto de nossos desejos. Quando nos apaixonamos, ficamos bem, leves, fora da realidade, vemos a vida brilhar... isso por que nos demos um grande presente, deixamos de nos menosprezar, de nossos ver defeitos. Com a paixão tudo de ruim de nós fica pequeno e começamos a nos dar valor, ver nossas coisas boas. Percebem que é uma coisa que estamos falando da pessoa apaixonada e não da outra, o objeto da paixão?

Se nós pudéssemos conviver melhor com as nossas virtudes e nossos defeitos, conhecendo a nós mesmos numa boa, sem nos rebaixarmos, sem nos elevarmos, olhando, sem sermos o máximo, sem sermos o mínimo, tudo seria melhor. Mas ao não sabermos lidar com os nossos defeitos, temos dificuldade de lidarmos com as nossas virtudes, nos negamos a admiti-las. A paixão atua exatamente aí, nesta dificuldade de nos aceitarmos como somos, da falta de amor próprio. Quem não gostaria de ganhar na loteria? Encobriria muito de nossas falhas profissionais, nós ficaríamos mais bacanas na foto, nos sentiríamos menos ruins nas segundas de manhã. A paixão é a loteria, que acoberta os nossos erros. Longe deles, podemos sentir o gosto bom da vida.

“Café, por favor, sem açúcar ou adoçante, pois de doce já basta a vida”. A vida é doce sim, o nosso planeta é doce, quando chove, faz sol, venta... estar rodeados de seres humanos é doce. Somos parte importante da criação divina. Podemos sentir o doce da vida sóbrios.

Muitas vezes vamos ver na capa de alguma revista alguém dizer; “este ano eu quero me apaixonar”. Ou seja, já comprei casa, casa na praia, já estou bem de vida, quero agora uma paixão... Tem amor nisso? Não. É uma coisa completamente egocêntrica, não tem nada a ver com a pessoa que ela irá se relacionar.

No livro acima, cita o militar Tristão indo buscar a princesa Isolda numa ilha, para que esta se case com o seu Rei. Na volta Isolda e Tristão tomam indevidamente a porção do “amor”, que faria com que o Rei e Isolda ficassem tão ligados que ao passar 3 anos a poção perderia efeito, mas aí os dois já estariam tão unidos que nada os separaria. Ou seja, a paixão é um sentimento que une as pessoas e que quando passa ela já estão juntas, unidas, com laços.

Quantos casais não conhecemos que passaram por isso? Sabemos de pessoas que eram inimigos numa outra encarnação e que agora estavam casadas e novamente com problemas. Nos perguntamos, como espíritos tão antagônicos conseguiram se casar? Os espíritos superiores usam isso para que o casal se una. É uma forma compulsória de ajudar dois espíritos a se entenderem, diminuírem suas diferenças.

Quanto mais evoluímos, poderemos nos afeiçoar sem necessitar de paixões. Quanto mais evoluídos, menos casamentos de expiações precisaremos passar. Passaremos aos casamentos tarefas, construtivos. Se somos evoluídos, não precisamos casar com nossos inimigos, pois podemos nos acertar com eles, perdoá-los de coração.

Mas Tristão e Isolda fugiram para a floresta e ficaram lá se amando e se adorando. Com o tempo estavam como maltrapilhos e fedidos. Eles não perceberam que estavam assim, pois estavam loucos de paixão. Quando o efeito da poção perdeu efeito, Tristão e Isolda ficaram mal. Tentaram recuperar o velho e “bom” sentimento, mas não conseguiram. Isolda se casou com o Rei e Tristão se casou com outra Isolda, a das mãos brancas. Isolda recuperou o seu papel, o seu destino, a sua missão. Tristão não ficou muito satisfeito com a sua nova Isolda, mas a Rainha não queria mais saber daquele sentimento de paixão. Ela agora tinha uma vida pra tocar. E Tristão tinha Isolda das mãos brancas, que tinhas mãos hábeis, costurava, cozinhava, passava, dava-lhe amor e carinho. Ela lhe dava amor, mas ele queria aquela paixão louca com a antiga amante. Com o tempo ele entendeu.

Paixão é por si próprio, não pelo outro. O outro é um objeto de nossos desejos. Amor é eterno, paixão momentânea. Se você está atrás de uma paixão, vá em frente. Mas cá entre nós, todos nós estamos mesmo é precisando de um abraço, de um olhar bondoso, de uma mão amiga, de uma luz que nos tire das trevas. Estamos sedentos de amor, mas procuramos paixão para nos saciar e ela não sacia.

Próximo post vai relacionar o Gostar do Amar. Num outro trataremos da eternidade do amor, mesmo para casais que se separam. Até.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Amor x Paixão - Parte I

O título deste texto coloca o “x” no sentido de versus, antagonizando estes dois sentimentos. Quando somos pequenos a nossa cultura ocidental nos ensina muitas coisas erradas sobre o amor e outras coisas certas. O resultado é uma incompreensão muito grande, lacunas em aberto, incoerências etc. Mas o pior não é o entulho filosófico que nossa sociedade carrega e transmite através das gerações, mas sim as consequências práticas e negativas no dia a dia de nossas vidas.

Este e outros textos que virão visam esclarecer o que é o Amor. Pretensioso? O leitor verá que não.

Se o evangelho de Jesus é a mensagem do amor que faltava para a nossa humanidade para que pudéssemos sair do nosso lodo milenar, não compreender o que significa amor (e ainda confundi-lo com paixão) é permanecer na ignorância e ficar bem perdido.

Em minha opinião, devemos buscar no latim as raiz do sentido mais real das palavras do nosso idioma. O português, assim como espanhol, veio do 'romance', adaptação do latim para a península ibérica. E foi o idioma latino o escolhido por Deus para transmitir em larga escala as ideias de Jesus. O hebraico, o grego, o aramaico, línguas pátrias do evangelho, tinham suas deficiências de apropriação dos usos de palavras e verbos que tinham dois ou mais sentidos. O latim foi um projeto mais moderno de idioma, o que deram mais clareza ao sentido dos ensinamento do Cristo.

Atualmente o uso da língua portuguesa no Brasil, nesta virada de século 20 para 21, está usando palavras com sentido próximo como se fossem sinônimo. Por isso, por mais moderna e adequada que seja o nosso idioma, cabe aqui recorrer ao Latim, pelo dicionário Português Latino, do Professor Francisco Torrinha, Editorial Domingos Barreira Porto.

Amor é “afeição profunda”, seus sinônimos são 'cáritas' (caridade, amor de Deus), 'voluntas' (vontade), 'studium' (dedicação, esforço, zêlo), 'benevolentia' (benevolência), 'robur' (energia, força moral). Veja que amor é sinônimo das virtudes que nos tiram da zona de conforto e nos exigem um esforço para realizar algo em relação ao próximo. Amor de Jesus é um amor atuante, não é contemplativo.

A chave do crescimento dentro de um casamento, de um namoro, uma amizade, pais e filhos, patrão e empregado, é a dedicação de ambos, um para o outro e para o relacionamento. Amor é uma coisa universal, falar em amor como uma degrau a mais do que gostar, falar em amor de pai ser diferente do que amor de homem para mulher, é apequenar o sentido de amor.

Amor é este sentimento que vai crescendo conforme as nossas atitudes. Só com o tempo e com o esforço é que aprendemos a amar. Aquele que ama muito, amará mais ainda. Aquele que ama pouco terá dificuldade de amar no princípio. Então amar é uma capacidade, uma coisa conquistada. Uma encarnação nos ajuda a amar. Ser filho, ser pai e mãe, ser marido e mulher, ser irmão, tudo isso já ajuda a aprendermos a amar. Assim como tudo na vida, por causa de nosso orgulho, egoísmo e vaidade, buscamos conhecimento para ter um carro do ano e isso nos obriga a estudar muito, aprender muito. Esta dedicação também ajuda a aumentar a nossa capacidade de amar.

No próximo texto falaremos da paixão, separando o amor deste defeito. Em um próximo, distinguiremos o gostar do amar. Até lá.